Na primeira foto, obras de alargamento da rua, na década de 1930. Na segunda imagem, o mesmo cenário em registro feito recentemente
Texto de Carlos Damião
Publicado em A Notícia (AN Capital), outubro de 2002
“A cidade passava por ali”. A frase do jornalista Aldírio Simões, colunista do ANcapital, define com perfeição o significado da Rua Felipe Schmidt para Florianópolis, pelo menos até os anos 80, quando a cidade ainda respirava o clima de província e não havia sido inteiramente invadida. Passar por ali significava saber das últimas, conferir se alguém morreu, palpitar sobre quem ganharia a eleição, falar mal da vida alheia.
É importante separar a rua em três partes: a primeira quadra, entre a Praça 15 de Novembro e a Trajano, a segunda, entre esta última e a Jerônimo Coelho, e a terceira, da Jerônimo Coelho até o final, nas proximidades da Ponte Hercílio Luz, onde havia o antigo bairro do Estreito (insular). São três ruas diferentes e foi sempre assim, desde o século 19, quando Florianópolis começou a crescer no sentido Oeste. Embora a Conselheiro Mafra, por causa do comércio, tenha sido a mais importante da capital até o início do século 20, mais tarde a Felipe Schmidt acabou se transformando na principal da cidade. Não só principal, mas também a mais charmosa, elegante, freqüentada e observada.
Sua origem remonta ao século 18, embora tivesse pequena extensão, indo até as imediações da atual Praça Pio 12, onde está hoje o estacionamento subterrâneo, ao lado das Lojas Americanas. O primeiro nome registrado, conforme o historiador Oswaldo Rodrigues Cabral, foi “Rua da Fonte do Ramos”, numa referência à fonte de água que brotava no local, depois chamado de Fonte da Carioca e Largo Fagundes.
Mais tarde, por causa dos moinhos de beneficiamento de arroz que os açorianos mantinham na região, foi denominada Rua dos Moinhos de Vento. A esse nome seguiu-se o de Rua Bela (1817), Rua Bela do Senado (1865), Rua do Senado e Rua da República (1889). Felipe Schmidt seria uma homenagem ao governador catarinense que, na década de 10 do século 20 conseguiu resolver “a velha questão de limites com o Paraná” (segundo Cabral).
Até a década de 1920, a rua conservava seus traços arquitetônicos, tipicamente coloniais, segundo a arquiteta Eliane Veras da Veiga, em seu livro “Florianópolis: Memória Urbana”. Em 1926, foi inaugurada a Ponte Hercílio Luz, que daria um novo perfil urbano para a capital, tirando a Ilha de Santa Catarina do isolamento em que se encontrava até aquele ano. A Felipe Schmidt passou a ser, então, a principal via de acesso do centro da cidade até a ponte, uma vez que o principal obstáculo – o cemitério municipal – havia sido removido um ano antes. A cidade crescia, aumentava o número de automóveis e era preciso prepará-la para os anos seguintes. Por causa disso, o então prefeito Mauro Ramos decidiu pelo alargamento da via, que até então mantinha as características originais, equivalentes às ruas Tiradentes e Fernando Machado de hoje.
O registro do pesquisador Adolfo Nicolich, em seu livro “Ruas de Florianópolis”, aponta o ano de 1928 como o do início das obras que poriam abaixo uma quantidade não identificada de casas térreas e sobrados típicos da arquitetura portuguesa e açoriana. “Vários cortes alteraram seu perfil”, registra Eliane Veras da Veiga. “Foi largada por volta da década de 30, o que provocou uma modernização edilícia, afastando-a de sua velha aparência colonial. Os prédios mais antigos tiveram de ser demolidos, ao exigir-se um recuo; outros tiveram suas fachadas reformadas, adotando uma decoração eclética. Alguns especialmente construídos por grandes e tradicionais firmas comerciais da cidade, passaram a adotar linhas similares, caracterizando visual próprio da empresa. Tais prédios podem ser observados ainda hoje”.
A segunda grande transformação da rua aconteceu a partir de 1976, quando foi concluído o calçadão, uma decisão do então prefeito Esperidião Amin, inspirada no modelo curitibano. Amin previu a explosão populacional da cidade e, após estudos técnicos, determinou o fim do reinado do automóvel, no trecho entre a Praça 15 de Novembro e a Rua Álvaro de Carvalho. Até porque, àquela altura, com a inauguração da segunda ponte – a Colombo Salles –, o uso da Felipe Schmidt como via de acesso à Ponte Hercílio Luz perdera importância. Dois anos antes, eram comuns os engarrafamentos que iam justamente da praça até a ponte, por causa do volume de tráfego.
Publicado em A Notícia (AN Capital), outubro de 2002
“A cidade passava por ali”. A frase do jornalista Aldírio Simões, colunista do ANcapital, define com perfeição o significado da Rua Felipe Schmidt para Florianópolis, pelo menos até os anos 80, quando a cidade ainda respirava o clima de província e não havia sido inteiramente invadida. Passar por ali significava saber das últimas, conferir se alguém morreu, palpitar sobre quem ganharia a eleição, falar mal da vida alheia.
É importante separar a rua em três partes: a primeira quadra, entre a Praça 15 de Novembro e a Trajano, a segunda, entre esta última e a Jerônimo Coelho, e a terceira, da Jerônimo Coelho até o final, nas proximidades da Ponte Hercílio Luz, onde havia o antigo bairro do Estreito (insular). São três ruas diferentes e foi sempre assim, desde o século 19, quando Florianópolis começou a crescer no sentido Oeste. Embora a Conselheiro Mafra, por causa do comércio, tenha sido a mais importante da capital até o início do século 20, mais tarde a Felipe Schmidt acabou se transformando na principal da cidade. Não só principal, mas também a mais charmosa, elegante, freqüentada e observada.
Sua origem remonta ao século 18, embora tivesse pequena extensão, indo até as imediações da atual Praça Pio 12, onde está hoje o estacionamento subterrâneo, ao lado das Lojas Americanas. O primeiro nome registrado, conforme o historiador Oswaldo Rodrigues Cabral, foi “Rua da Fonte do Ramos”, numa referência à fonte de água que brotava no local, depois chamado de Fonte da Carioca e Largo Fagundes.
Mais tarde, por causa dos moinhos de beneficiamento de arroz que os açorianos mantinham na região, foi denominada Rua dos Moinhos de Vento. A esse nome seguiu-se o de Rua Bela (1817), Rua Bela do Senado (1865), Rua do Senado e Rua da República (1889). Felipe Schmidt seria uma homenagem ao governador catarinense que, na década de 10 do século 20 conseguiu resolver “a velha questão de limites com o Paraná” (segundo Cabral).
Até a década de 1920, a rua conservava seus traços arquitetônicos, tipicamente coloniais, segundo a arquiteta Eliane Veras da Veiga, em seu livro “Florianópolis: Memória Urbana”. Em 1926, foi inaugurada a Ponte Hercílio Luz, que daria um novo perfil urbano para a capital, tirando a Ilha de Santa Catarina do isolamento em que se encontrava até aquele ano. A Felipe Schmidt passou a ser, então, a principal via de acesso do centro da cidade até a ponte, uma vez que o principal obstáculo – o cemitério municipal – havia sido removido um ano antes. A cidade crescia, aumentava o número de automóveis e era preciso prepará-la para os anos seguintes. Por causa disso, o então prefeito Mauro Ramos decidiu pelo alargamento da via, que até então mantinha as características originais, equivalentes às ruas Tiradentes e Fernando Machado de hoje.
O registro do pesquisador Adolfo Nicolich, em seu livro “Ruas de Florianópolis”, aponta o ano de 1928 como o do início das obras que poriam abaixo uma quantidade não identificada de casas térreas e sobrados típicos da arquitetura portuguesa e açoriana. “Vários cortes alteraram seu perfil”, registra Eliane Veras da Veiga. “Foi largada por volta da década de 30, o que provocou uma modernização edilícia, afastando-a de sua velha aparência colonial. Os prédios mais antigos tiveram de ser demolidos, ao exigir-se um recuo; outros tiveram suas fachadas reformadas, adotando uma decoração eclética. Alguns especialmente construídos por grandes e tradicionais firmas comerciais da cidade, passaram a adotar linhas similares, caracterizando visual próprio da empresa. Tais prédios podem ser observados ainda hoje”.
A segunda grande transformação da rua aconteceu a partir de 1976, quando foi concluído o calçadão, uma decisão do então prefeito Esperidião Amin, inspirada no modelo curitibano. Amin previu a explosão populacional da cidade e, após estudos técnicos, determinou o fim do reinado do automóvel, no trecho entre a Praça 15 de Novembro e a Rua Álvaro de Carvalho. Até porque, àquela altura, com a inauguração da segunda ponte – a Colombo Salles –, o uso da Felipe Schmidt como via de acesso à Ponte Hercílio Luz perdera importância. Dois anos antes, eram comuns os engarrafamentos que iam justamente da praça até a ponte, por causa do volume de tráfego.